Atuando diretamente sobre as emoções dos clientes, o marketing olfativo evoluiu e se transformou em importante ferramenta para o varejo
Não há quem resista ao cheiro de pão quentinho saído do forno ou de café coado na hora. Ou, ainda, não tenha boas lembranças ao sentir o perfume da terra molhada e da grama recém-cortada. Hoje, graças à evolução da tecnologia e à busca constante de diferenciais para produtos e marcas, esses e milhares de outros aromas podem ser reproduzidos artificialmente, transformando-se em um instrumento de marketing na disputa pela fidelidade do consumidor.
‘Uma boa composição olfativa é capaz de atrair a atenção do cliente, podendo aumentar o tráfego no estabelecimento, a velocidade de visitação, o tempo de permanência dentro da loja, despertar a fome e até a libido’, afirma Eduardo Caritá, dono da Croma Microencapsulados, fabricante de microcápsulas para aromatização de ambientes e mídias. Segundo o especialista, com a comunicação olfativa é possível devolver ao consumidor cheiros que ele deixou se sentir, seja por causa da poluição ambiental ou da adoção de embalagens a vácuo.
Diferentemente do que supõe a maioria, a aplicação das novas tecnologias olfativas não se restringe à indústria alimentícia ou cosmética. As montadoras de automóveis há tempos encomendam ‘cheiros de carro novo’ que atendam às expectativas de seus consumidores. Na Europa, o que agrada é basicamente a mistura de couro e tinta. Já no Brasil é a combinação de vinil, plástico e borracha. ‘Cada vez mais a indústria, o varejo e os prestadores de serviço estão buscando um aroma próprio para fixar a imagem’, avisa Caritá.
A Croma, que atende clientes como Amor aos Pedaços, Unilever, O Boticário, Natura e a Makro Atacadista, também invadiu o sambódromo carioca no último carnaval com 400 quilos de microcápsulas contendo óleo de casca de laranja, com o objetivo de promover o lançamento de um novo suco de fruta. Sem contar a parafernália adotada no show ‘Quatro Estações’, da dupla Sandy & Júnior, que fez as fãs entrarem no clima do espetáculo com o perfume de rosas (representando a primavera) e de musgo (inverno).
CONCEITO NOVO – Foram os americanos os primeiros a fazer do aroma um aliado, usando-o para manter os apostadores mais tempo diante das mesas de jogos nos cassinos de Las Vegas, ainda na década de 70. Chineses e japoneses também investiram na aromatização dos mais diversos tipos de ambiente e até o metrô de Paris tem sua própria marca olfativa. No Brasil, esse é um conceito novo, iniciado em meados dos anos 90 por alguns supermercados dispostos a atrair a atenção dos consumidores para áreas de pouco tráfego ou para um novo produto em oferta. Depois vieram as feiras e exposições e, há não mais de três anos, uma demanda mais significativa por parte do varejo e de promotores de eventos artísticos e culturais.
‘Com produtos e serviços cada vez mais iguais depois da globalização, o comércio percebeu que precisava buscar um diferencial que mexesse com a emoção. E a criação de uma identidade olfativa cumpre esse papel’, explica Valéria Werneck, sócia da Nose Around, especializada em tendências de consumo.
A rede de docerias Amor aos Pedaços foi uma das primeiras a usar a ferramenta, tendo adotado uma composição aromática criada especialmente para ela, com base de morango e chocolate. ‘Já tínhamos um apelo visual forte na vitrine e aguçar o olfato só ajudou a completar o conceito de produto montado na hora e sempre fresquinho’, explica Alexandre Viana, gerente de marketing. O executivo não sabe mensurar o quanto a aromatização das 42 lojas da rede alavancou as vendas, mas garante que, todos os dias, recebia comentários de consumidores satisfeitos com a novidade.
Escolher um aroma que se identifique com o negócio e, principalmente, que desperte algum tipo de sensação agradável no público da casa é um exercício que pode levar meses e, às vezes, até anos. Segundo Fernando Amaral, sócio da Aromagia, especializada no desenvolvimento de fragrâncias, a comunicação olfativa deve ser personalizada e só cumpre o seu papel quando evoca a lembrança de determinada marca ou lugar. ‘Aromas clássicos, disponíveis para todo o mercado, não surtem efeito porque estão veiculados a outras referências e podem confundir o consumidor, que não saberá exatamente onde e quando sentiu aquele cheiro’, explica Amaral.
Para colher bons resultados, o caminho é fazer uma análise da faixa etária, origem e hábitos do consumidor, cruzando esses dados com o conceito da marca e do produto. ‘Em nenhum momento devemos esquecer que o repertório olfativo tem uma permanência na memória das pessoas maior do que o visual. A imagem fixa-se por alguns meses; o cheiro, por anos. E se apresentar algum envolvimento emocional, pelo resto da vida’, afirma Caritá, lembrando que há aromas característicos de cada década (leia o quadro’Festa dos sentidos’).
Dentro desse conceito, uma loja voltada a mulheres da terceira idade, por exemplo, não deve dispensar notas olfativas que lembrem pó-de-arroz ou lança-perfume. Ao mesmo tempo, é preciso refutar tudo o que possa ser associado a experiências negativas vividas pelas pessoas, como cheiro de fumaça, sangue, velório e hospital. ‘A mais remota ligação com qualquer uma dessas situações pode provocar repulsa no consumidor e deitar por terra todo um trabalho de imagem da marca’, alerta Caritá. Outro ponto importante é lançar a dose certa da fragrância no ambiente. Nem mais, nem menos. Independentemente do método utilizado – difusão, aspersão, ventilação, volatilização, evaporação ou nebulização -, a regra é trabalhar no limite mínimo da percepção humana, a fim de não provocar mal-estar ou sensibilização. A fragrância não pode se impregnar na pele, na roupa ou no cabelo das pessoas.
Fonte: http://revistapegn.globo.com/Empresasenegocios/0,19125,ERA463263-2491,00.html